No “Ensaio sobre a cegueira”, leitura obrigatória nos dias de hoje, há uma passagem onde Saramago realiza um debate de gênero que oferece uma inquietante reflexão. No livro, todas as pessoas que ficaram cegas, acreditava-se que era uma epidemia, foram confinadas num hospício desativado e entregues à própria sorte.
O governo fornecia os alimentos em porções diárias e impedia que alguém saísse para evitar o contágio, no entanto, um grupo de homens se destacou dos demais e passou a controlar a comida exigindo que as mulheres se deitassem com eles em troca da alimentação. Evitando o conflito, os demais homens passaram a pressionar as mulheres que para que elas fossem pragmáticas e se submetessem pelo bem de todos.
– E o que é que vocês fariam se eles, em vez de pedirem mulheres, tivessem pedido homens? Questionou uma mulher.
– Aqui não há maricas! Protestou um homem!
– E aqui ninguém é puta, e ainda que haja, pode ser que não estejam dispostas e sê-lo por vocês. Retorquiu a mulher que fizera a pergunta desconcertante.
No diálogo, o desrespeito aos desejos dos homossexuais fica evidente na resposta do homem. Na resposta da mulher, ele é sutil.
Luciano Mannarino.