O último mapa

Entre Paisagens Perdidas e Regiões Antigas

Já não se vive mais a rua. A árvore em frente ao portão não é notada. O banco da praça está sempre vazio, mesmo que o céu insista em fazer seu espetáculo cotidiano. O espaço vivido se tornou um eco, um rastro fraco de uma geografia que se apagou nos olhos dos jovens — e que, pouco a pouco, também se apaga nos olhos cansados do professor.

A paisagem, antes forma viva, tornou-se plano de fundo para selfies e vídeos curtos. A sutileza dos conceitos – espaço, lugar, território – se dilui diante do brilho hipnótico das telas. Tentar explicá-los é como sussurrar ao vento em meio ao ruído das notificações. Não há tempo para contemplação, nem desejo de compreender o mundo que está para além da palma da mão.

E o professor? Antes entusiasta das grandes correntes do pensamento geográfico, agora se vê resignado. Volta aos mapas físicos, às divisões regionais, à boa e velha geografia dos continentes. Não por nostalgia, mas porque já não há força para disputar o olhar com os algoritmos. A aula se tornou abrigo, não batalha. A cartografia, refúgio. Ensina-se a regionalização do Brasil com a ternura de quem narra um tempo que já não volta.

Mas no fundo — lá no fundo — ainda pulsa a lembrança do que foi um dia: o lugar como espaço vivido, o espaço como construção coletiva, a paisagem como livro aberto. O mestre, então, ensina. Ensina o que ainda pode. E espera. Espera o tempo da aposentadoria, mas também espera que, em algum momento, um aluno olhe pela janela e pergunte: “Professor, o que é aquela montanha ali no fundo?”
Talvez ali renasça alguma geografia.

Luciano Mannarino é Prof de Geografia.

Seu comentário é muito importante!!!