Encontro de chanceleres do grupo Quad tem retórica agressiva puxada por Mike Pompeo
Igor Gielow
SÃO PAULO
Estados Unidos, Japão, Austrália e Índia fizeram uma demonstração de força contra a China durante encontro de seus ministros de Relações Exteriores em Tóquio.
Eles formam o chamado Quad, sigla inglesa pra Diálogo de Segurança Quadrilateral, grupo que foi ressuscitado em 2017 para buscar criar o que a China já chamou de “mini-Otan” no Pacífico, aludindo à aliança militar americana na Europa contra os soviéticos e, depois, os russos.

Os ministros prometeram tomar medidas concretas para manter a região do Indo-Pacífico “livre e aberta”, um recado direto às pretensões em curso de Pequim, de controlar 85% do mar do Sul da China, sua principal saída comercial com o mundo.
Não houve, contudo, a temida provocação por parte do mais belicoso dos chanceleres, o secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, com uma inédita visita surpresa a Taiwan, que a China considera uma ilha rebelde.
Pompeo foi quem tomou a frente em termos de retórica. “Como parceiros, é mais crítico agora do que nunca que nós colaboremos para proteger nossos povos da exploração, corrupção e coerção do Partido Comunista Chinês. Nós as vemos nos mares do Sul e do Leste da China, no Mekong, nos Himalaias, no estreito de Taiwan”, afirmou.
O secretário buscou efeito midiático máximo no momento em que seu chefe está atrás nas pesquisas da corrida eleitoral, que acaba em 3 de novembro. O tema China sempre catalisou apoio para Donaldo Trump.
Mas não é só isso. A fala seguiu o tom usual do secretário, visto como um dos principais “falcões” da Guerra Fria 2.0 proposta por Trump ao chegar ao poder em 2017.
O próprio Quad, que agora terá reuniões anuais de seus ministros, é resultado dessa nova realidade. Ele existiu brevemente em 2007, mas acabou por falta de apetite dos membros em confrontar a China. Foi reanimado.
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Neste 2020, o cenário é particularmente mais complexo, ainda que o risco de guerra ampla seja considerado baixo. A Índia, que sempre viu o grupo como uma forma de pressionar a China em suas negociações comerciais, está efetivamente do lado dos EUA desde que houve os embates citados por Pompeo nos Himalaias.
Nova Déli e Pequim disputam fronteira naquela região e montaram uma escalada militar, ora congelada com mediação de Moscou, depois que escaramuças deixaram dezenas de mortos em junho.
Já a Austrália tomou a frente das críticas aos chineses pela condução inicial da pandemia do novo coronavírus, surgida em Wuhan. Hoje isso é uma pedra de toque da administração Trump, e mesmo nesta terça Pompeo voltou a falar no “vírus chinês”.
“Seja em direitos humanos individuais, economias de mercado, combatendo desinformação ou construindo maior resiliência em nossas cadeias produtivas, nossos valores e interesses comuns significam que dividimos uma visão de um Indo-Pacífico livre, aberto e próspero”, escreveu no Facebook a chanceler australiana, Marise Payne, depois do encontro.
A Índia foi menos assertiva em sua mensagem, mas o tom mais frio veio por parte dos anfitriões. O governo do premiê Yoshihide Suga acaba de assumir, e ele irá receber o chanceler chinês neste mês.
Testando ainda o terreno, o chanceler japonês, Toshimitsu Motegi, não citou a China em sua fala inicial, ainda que relatos posteriores indiquem que a questão das ilhas que Pequim reivindica para si hoje sob controle de Tóquio foi discutida.
Nos últimos anos, o antecessor de Suga, Shinzo Abe, promoveu uma ativa remilitarização do Japão, país de conturbado passado expansionista e forte tendência pacifista.

Pompeo foi embora do Japão, tendo encurtado o que seria uma visita à Mongólia e à Coreia do Sul, o que ensejava o temor de uma “esticadinha” em Taiwan entre os chineses. Ele retornou devido ao diagnóstico de Covid-19 de Trump.
Desde agosto, duas autoridades americanas estiveram na ilha, o que implica um reconhecimento diplomático que não existe no papel —EUA e China têm relações desde 1979.
A reação chinesa seria inevitável, na forma de alguma demonstração de poderio militar no estreito de Taiwan, o que sempre pode sair do controle.
O encontro desta terça também abriu o caminho para que a Austrália faça parte dos exercícios militares navais anuais que unem Índia e EUA desde 1992 e, a partir de 2015, integraram também o Japão.
Chamadas de Malabar, as manobras atuam em áreas de interesse estratégico da China. Observando um mapa, a posição dos membros do Quad explicita um cerco geopolítico que Pequim não tem como deixar de notar, apesar das declarações minimizando a eficácia do grupo por parte da chancelaria chinesa.
Questões
1. Por que o governo chinês chama o Quad de mini-OTAN?
2. Explique a permanente tensão entre a China e a Ilha de Formosa.
3. O seria a Guerra Fria 2.0?
4. A remilitazação do Japão é apoiada pelos EUA? Justifique.
Prof Luciano Mannarino